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Por Thiago Rafael Vieira

Em muitos países onde o aborto é legalizado, uma triste realidade destoa do alegado discurso pró-liberdade e da defesa dos direitos da mulher: o aborto da menina no ventre. Muitas vezes, os pais, ao descobrirem que estão esperando uma menina, simplesmente optam pela sua morte. Na China, onde o aborto é legalizado desde 1953 e o controle de natalidade é obrigatório, com a terrível política do filho único (amenizada para dois filhos em 2013), quando os pais descobrem que a criança no ventre é uma menina, a sua morte é uma opção seriamente considerada. A seleção de sexo é proibida na China desde 1994, mas continua ocorrendo, resultando em um número elevado do nascimento de meninos em detrimento das meninas; estima-se que, na população chinesa, haja 121 homens para cada 100 mulheres – a proporção no nascimento é ainda maior: 130 meninos para 100 meninas. Atualmente, o contingente masculino na China supera o feminino em quase 25 milhões de indivíduos.

A morte das mulheres no ventre não se restringe aos países com controle de natalidade severo ou com uma cultura de castas que privilegia o homem: acontece também na Austrália, Canadá, Reino Unido e Estados Unidos, entre outras nações. Nesses países, o abort selection é, também, um instrumento de seleção eugênica: por mais que seja proibido, como identificar que os pais ou a mãe querem abortar em razão de a criança ser uma menina, ter síndrome de Down ou até mesmo lábio leporino? A eugenia, tão prestigiada por Hitler na busca da pura raça ariana e duramente criticada, retorna mascarada de direitos de escolha da mulher.

Nos Estados Unidos, em 2015, foi criada uma lei (o Prenatal Nondiscrimination Act ) criminalizando o sex selection, tão elevada era sua prática. Em 2016, o jornal inglês The Telegraph denunciou um esquema de médicos britânicos que ofereciam o sex selection para quem quisesse pagar.

São milhões de mulheres que deixam de nascer todos os anos, isso sem falar daquelas com alguma deficiência, porque foram intencionalmente preteridas em razão de seu sexo. Isso vai além de discriminação pré-natal: é feminicídio. Segundo a Lei Federal 13.106/2015, considera-se homicídio qualificado – logo, crime hediondo – se o homicídio é cometido contra a mulher por sua condição de pertencer ao sexo feminino. Quando os pais resolvem abortar o bebê que está no ventre por ser uma menina, não estamos diante de um feminicídio? Sim, estamos. O pior dos feminicídios, porque nesse caso a mulher não tem a menor chance de se defender.

A pergunta que não quer calar é: alguém já viu as organizações sociais pró-aborto e os movimentos feministas organizarem passeatas na China, na Índia, nos Estados Unidos, na Inglaterra ou em qualquer outro país contra a seleção por sexo? Alguém já viu algum destes movimentos buscando políticas governamentais de conscientização contra o aborto nesses casos? Não, jamais se viu e nunca se verá. A real preocupação desses grupos não parece ser os direitos e garantias da mulher – se assim fosse, como não lutar contra o absurdo de centenas de milhões de mulheres mortas ainda no ventre, em todo o mundo, pelo simples fato de serem mulheres? Enquanto tais grupos lutam pela legalização do aborto ou a sua flexibilização sob a falácia de que o fazem em prol das mulheres, as meninas morrem no ventre, suas mães ficam com o trauma de terem abortado e a vida (para os que não foram abortados) continua, bem como toda a indústria que lucra com a expansão do aborto. O fato é que vivemos em uma nova Babel, onde se ressignificam conceitos, esconde-se a realidade e cria-se uma realidade virtual baseada em suas narrativas, uma verdadeira cidade da confusão, como muito bem explica Francisco Razzo em seu livro Contra o Aborto.

O resumo desta história anunciada por Razzo é simples: se você tiver a impressão de que é melhor para você fazer o aborto porque o bebê é uma menina, ou porque tem síndrome de Down, lábio leporino, então… não há nada que o impeça, pois isso diz respeito somente a você. Aborte-os, pois eles lhe serão inconvenientes. No fim das contas, mais do que a busca da liberdade, de emancipação, de autoafirmação ou de qualquer demanda mais ou menos justa, este pleito de empoderamento feminino parece buscar um superdireito: o direito de matar.

Thiago Rafael Vieira, advogado pós-graduado em Direito do Estado e Estado Constitucional e Liberdade Religiosa, é diretor nacional da Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure).

 

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