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Local é conhecido pela presença de fósseis de 280 milhões de anos
Obra estava com mais de 52% concluída e não há previsão de retomada até o momento. Foto: Esther Kremer

Esther Kremer

Desde o dia 10 de outubro, a obra de pavimentação da PR-364, no trecho entre Irati e São Mateus do Sul, com implementação de viaduto no entroncamento com a BR-153, próxima à Unicentro, em Irati, foi interrompida por recomendação do Ministério Público Federal (MPF), que apontou falhas no licenciamento ambiental do projeto. A obra, com investimento ultrapassando o valor de R$23 milhões, estava com 52,72% dos serviços concluídos.

Durante a realização da obra, na fase inicial da construção do viaduto, foram encontradas mostras da espécie Mesosaurus brasilienses, um réptil aquático, caracterizado por viver em água salobra (hipersalino) no período Permiano Inferior, antes dos dinossauros, há cerca de 280 milhões de anos. Segundo pesquisadores, a espécie comprova a teoria da deriva continental e teoria de que os continentes já estiveram unidos em um supercontinente chamado Pangeia.

As amostras foram colhidas e estão armazenadas na Unicentro, em Irati, no Departamento de Geografia. Apesar de a instituição de ensino e pesquisa ter colhido os fósseis no local, não foi a responsável pela paralização da obra. Segundo o próprio MPF, a licença ambiental foi cancelada por não constar a análise do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).

De acordo com a nota oficial, o Instituto Água e Terra (IAT) acatou à recomendação e cancelou a licença ambiental simplificada (LAS nº 5580) que autorizava as obras. “O IAT havia concedido a licença sem a devida análise e manifestação do Iphan, o que caracteriza falha no processo de licenciamento ambiental”. A procuradora da República, Monique Cheker, autora do documento, argumenta que o trecho, próximo à antiga pedreira Carlito Molinari, apresenta potencial risco de dano ao patrimônio histórico e ambiental.

Obra na PR-364 faz ligação entre Irati e São Mateus do Sul. Foto: Esther Kremer

O secretário de Infraestrutura e Logística do Paraná (Seil), Sandro Alex, afirmou à Folha de Irati que o Governo sempre colaborou com todas as investigações sobre a existência de fósseis. “Estamos trabalhando em todas as esferas para que a obra seja concluída, uma vez que já está em fase bem adiantada e as etapas de escavações já foram, em sua maioria, superadas. Vamos separar a obra para que possam ser realizados todos os estudos necessários, tanto pela Unicentro quanto pelo Iphan, e de outro lado para que seja preservado o direito de finalização da pavimentação de forma que a população não seja penalizada com a paralização da obra”.

Obras suspensas e reformulação do licenciamento

O Instituto Água e Terra (IAT), em nota, informou que a licença ambiental foi cancelada e será reformulada conforme a legislação em vigor. “Atendendo a um pedido do MPF, a licença ambiental foi cancelada pelo Instituto IAT e será reformulada de acordo com a legislação em vigor, respeitando todos os trâmites e condicionantes exigidos”.

O DER/PR (Departamento de Estradas e Rodagem), também se manifestou por meio de nota oficial, dizendo que “se trata de um trecho de pavimentação de 1,6 km da PR-364 no perímetro urbano do município, com implantação de viaduto no entroncamento com a BR-153, estando 52,72% executada. O investimento na empreitada é de R$ 23.700.000,00. O tráfego atualmente é realizado por via municipal para acesso entre as rodovias. O DER/PR reitera o compromisso em garantir que as suas obras sejam executadas de acordo com a legislação ambiental vigente, proporcionando segurança e trafegabilidade para os usuários, aliadas ao desenvolvimento sustentável, um dos pilares da gestão atual”.

Importância paleontológica de Irati

O professor e doutor Luiz Carlos Basso, do Departamento de Geografia da Unicentro, explicou que a área onde a obra é executada faz parte de uma região rica em fósseis pertencentes ao período Permiano. Segundo ele, os mesosauros encontrados habitaram o antigo “Mar Irati” e têm grande importância científica e histórica, tornando o município conhecido nacionalmente pela descoberta.

Fósseis de Mesosauros brasilienses estão na Unicentro/Irati. Foto: Esther Kremer

Os fósseis ajudaram a comprovar, ainda, a existência do supercontinente Gondwana, que surgiu após a fragmentação da Pangeia e foi composto pela América do Sul, África, Índia, Austrália e Antártida. “Eles representam uma parte essencial da história geológica do planeta e precisam ser preservados. Em Irati, os fósseis foram descobertos ainda na época que estavam construindo a estrada de ferro, onde os pesquisadores, engenheiros, geólogos que estavam trabalhando na construção da estrada, se deram conta que esse material também estava sendo estudado em outro lugar, na África do Sul” explica.

Desta forma, os pesquisadores conseguem comprovar que os continentes já estiveram interligados e que houve, de fato, a separação. “As pessoas não entendem os motivos de estudarmos e pesquisarmos os fósseis, mas é de uma importância extrema. Nada acontece por acaso e as pesquisas existem para explicar esses momentos históricos”.

O professor também lembrou que retirar fósseis sem autorização é crime inafiançável, pois se trata de patrimônio da União. “Não retirem os fósseis, não levem para casa, procure por uma instituição de ensino e pesquisa, pois se você quebrar, retirar do local, é considerado um crime federal”, comenta Basso.

Até o fechamento desta edição, não houve previsão oficial para a retomada das obras. Segundo o MPR, a liberação depende agora da reformulação da licença e da autorização do Iphan. O Governo do Estado estuda alternativas técnicas e legais para garantir a continuidade dos trabalhos sem comprometer o patrimônio ambiental e arqueológico.

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